California Raining por Madeleine Peyroux, em execução
Encontrei com ele debaixo do sol de meio dia. Chegamos juntos, vindo de lados opostos da rua e paramos ao lado de um jardim de pedras. Engraçado como nos encontramos quase sempre nessas horas assassinas.
O barulho de carros que me entontecia logo é abafado, a luz que me torpedeava a vista torna-se apenas luz. Que bela figura, ele. Como gosto de vê-lo sorrindo sem graça, o corpo ainda desengonçado. Sobre o seu jeans desbotado há uma mancha bem viva de caneta bic estourada. A mancha parece o mapa da Itália. Ele diz nunca ter prestado atenção no mapa da Itália e suspira. Ele torna-se emotivo quando estamos juntos. Ao telefone é distante e desinteressado. Agora lembro os poemas que um dia ele escreveu pra mim, umas vinte páginas manuscritas entregues por suas mãos morenas e magrelas, trêmulas. Pediu para que eu apenas lesse e jamais comentasse. Nunca os li, permanecem dentro da mesma pasta fumê pouco mais de um ano depois. Tento me arrepender por não saber o conteúdo daquelas páginas, mas não consigo. Existe um prazer em mantê-las mudas.
Ele sorri, admirado com a simetria das marcas de suor na minha camisa. Repetimos tudo bem, para perguntas e respostas, duas vezes seguidas e não sei porque estamos nervosos. Nos abraçamos, arriscando mais naturalidade. Beijo-o no pescoço, e me arrependo. Sua pele não tem o mesmo cheiro. Por que não estamos fluindo? Me pergunto enquanto olho para um cactos enorme.
O hálito dele cheirava ocre, os olhos tão mal dormidos quanto os meus. De súbito ele me agarra, como um cão desajeitado. Seu coração bate veloz e tento não pensar em mais nada. Não importa a buzina dos carros, nada importa mais do que a falha dos dentes dele aparecendo dentro do sorriso amplo. O entusiasmo dele dizendo eu consegui, nossa, eu consegui! Que reação exagerada, penso eu traindo o momento. O que não esmorece a excitação, ela cresce. Conseguiste o quê, rapaz? Quero saber dele, fingindo desinteresse como um pai convicto. Vou embora pro Rio, ele diz. O entusiasmo, o exagero, o sorriso, a excitação. Eu não entendi muito bem, mas calei, fixando a quase perfeição da Itália em miniatura.
Tarco Zan
Encontrei com ele debaixo do sol de meio dia. Chegamos juntos, vindo de lados opostos da rua e paramos ao lado de um jardim de pedras. Engraçado como nos encontramos quase sempre nessas horas assassinas.
O barulho de carros que me entontecia logo é abafado, a luz que me torpedeava a vista torna-se apenas luz. Que bela figura, ele. Como gosto de vê-lo sorrindo sem graça, o corpo ainda desengonçado. Sobre o seu jeans desbotado há uma mancha bem viva de caneta bic estourada. A mancha parece o mapa da Itália. Ele diz nunca ter prestado atenção no mapa da Itália e suspira. Ele torna-se emotivo quando estamos juntos. Ao telefone é distante e desinteressado. Agora lembro os poemas que um dia ele escreveu pra mim, umas vinte páginas manuscritas entregues por suas mãos morenas e magrelas, trêmulas. Pediu para que eu apenas lesse e jamais comentasse. Nunca os li, permanecem dentro da mesma pasta fumê pouco mais de um ano depois. Tento me arrepender por não saber o conteúdo daquelas páginas, mas não consigo. Existe um prazer em mantê-las mudas.
Ele sorri, admirado com a simetria das marcas de suor na minha camisa. Repetimos tudo bem, para perguntas e respostas, duas vezes seguidas e não sei porque estamos nervosos. Nos abraçamos, arriscando mais naturalidade. Beijo-o no pescoço, e me arrependo. Sua pele não tem o mesmo cheiro. Por que não estamos fluindo? Me pergunto enquanto olho para um cactos enorme.
O hálito dele cheirava ocre, os olhos tão mal dormidos quanto os meus. De súbito ele me agarra, como um cão desajeitado. Seu coração bate veloz e tento não pensar em mais nada. Não importa a buzina dos carros, nada importa mais do que a falha dos dentes dele aparecendo dentro do sorriso amplo. O entusiasmo dele dizendo eu consegui, nossa, eu consegui! Que reação exagerada, penso eu traindo o momento. O que não esmorece a excitação, ela cresce. Conseguiste o quê, rapaz? Quero saber dele, fingindo desinteresse como um pai convicto. Vou embora pro Rio, ele diz. O entusiasmo, o exagero, o sorriso, a excitação. Eu não entendi muito bem, mas calei, fixando a quase perfeição da Itália em miniatura.
Tarco Zan
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